terça-feira, 25 de junho de 2013

Monólogos com o meu Bispo - na fé e na vida (11)

100 dias de renovação
Meu caro Bispo, D. António Marcelino
Faz mais de 100 dias que o "dia-a-dia" vai mais retirando, cada vez mais, tempos, serenidade, disponibilidade. Faz mais de 100 dias que não lhe escrevia, não por esquecimento mas, unicamente, por falta de oportunidade.
Quis o 'destino' (personificado no que quisermos entender como tal) que algo forçasse a este retomar o contacto consigo precisamente quando no final da passada semana, Papa Francisco celebrou os 100 primeiros dias do seu Pontificado.
Começo por estas breves palavras que serão publicadas na edição de amanhã, 25 de junho, do Diário de Aveiro.
«A marca no calendário dos “100 dias” é uma marca mítica que regista pouco mais de três meses de acção, por exemplo, de um Governo. Mas também significa, desde março deste ano uma nova era na Igreja Católica com os 100 primeiros dias do pontificado do Papa Francisco. Não se esperaria que um Papa que veio “do fim do mundo”, como fez questão de mencionar, arredado de todo o jogo de poderes da Cúria, ao fim de 100 dias tivesse revolucionado o Vaticano. Mas aquele jesuíta, com espírito franciscano, que tinha sido muito votado e renunciado ao pontificado no conclave que elegeu Bento XVI, teve, para já, um indiscutível mérito: revolucionou a Igreja. Uma Igreja que o Papa Francisco quer menos institucional, menos clerical, menos “curiana” (daí as pequenas mas importantes perspectivas de reformas internas que forma já providenciadas). Uma Igreja mais evangelizadora, mais próxima dos crentes e mais aberta aos não crentes, mais perto e preocupada com os que mais precisam, muito mais inclusiva e menos “castradora”. Mesmo que a muitos (clericais ou leigos) esta perspectiva de uma mudança histórica na Igreja (que vá, definitivamente, ao encontro do Concílio Vaticano II e da imagem da Igreja do carismático Papa João XXIII) custe a saída da zona de conforto, dos meandros do “carreirismo”, dos movimentos cinzentos da Cúria e da própria Igreja. Daí que o Papa Francisco (que os mais cépticos esperariam a queda do “pedestal”) tenha surgido, aos olhos de muitos crentes e de uma grande parte da estrutura da Igreja, com um carisma totalmente fora do habitual: um Papa muito próximo das pessoas, dos que precisam, com palavras e gestos simples mas que marcam, que distinguem, que tocam. Um Papa com um testemunho de vida muito forte e relevante. Um Papa que irá, com toda a certeza, renovar a Igreja e que marcará uma era no catolocismo pós João XIII mais determinante que a dos seus sucessores (Paulo VI, João Paulo I, mesmo João Paulo II, Bento XVI). Finalmente, após junho de 1963 “Habemus (sem qualquer margem de dúvida) Papam”.»
São inúmeros os gestos e as palavras simples mas marcantes, as quebras inocentes e sem quaisquer  segundos sentidos (mediatismo, culto da imagem, marketing) do protocolo apenas pela simplicidade e humildade da vida, o sentido de proximidade, a justiça, a solidariedade, a caridade, a evangelização.
Não seria, neste momento, fácil descrever tudo o que o Papa Francisco fez e disse. Aliás, será para si, caro Bispo, muito mais simples esse exercício de memória.
Há, no entanto, três aspectos que, na minha modesta opinião e de quem há muito esperava por esta renovação da Igreja (após o exemplo que foi João XXIII), marcaram profundamente estes primeiros 100 dias de pontificado do Papa Francisco, um Jesuíta que veio do "fim do mundo" com um coração de Franciscano.
Primeiro, logo no dia da sua eleição, quando no simples discurso na varanda do Vaticano pediu aos milhares de presentes na Praça D. Pedro que fizessem a coisa mais simples e que tantas vezes é esquecida: rezar a Oração (a primeira oração) e que Cristo ensinou aos Apóstolos (o Pai Nosso); a Avé Maria e o Glória ao Pai. Nada mais simples... nada mais inesperado, mas nada mais marcante.
Segundo, a visão que o Papa Francisco tema da Igreja. Não apenas a Igreja de Cristo, a dos pobres, dos excluídos, dos doentes, dos crentes, das paróquias, famílias, das comunidades, mas também a da sua estrutura e organização. Faz recordar a passagem de qualquer um dos Evangelhos quando Jesus "virou e expulsou os vendedores do Templo". É evidente que nada se faz hoje sem a presença da economia... infelizmente até para ajudar os mais necessitados. Mas economia não pode escravizar, dominar. Ou serve as pessoas e as comunidades, ou, ao servir-se destas, "demoniza", oprime e não liberta. E também uma Igreja aberta a TODOS, aos casados, aos divorciados, aos pecadores (recordemos o "lava pés" na casa de correcção e a uma jovem muçulmana), aos não crentes, aos que procuram Cristo, aos que desejam o baptismo (independentemente da sua condição)... uma Igreja de "Portas Abertas".
Por último, a sua devoção a Maria, mãe de Deus, de Jesus e da Igreja. Por um lado ao consagrar o seu pontificado a Nossa Senhora, mas também porque esta sempre foi uma das suas "marcas" ainda quando Arcebispo de Buenos Aires. Isso é patente, não apenas na devoção a Nossa Senhora de Lujan (Argentina) como por exemplo na compilação de textos de homilias, peregrinações, reflexões, e publicados no livro "O verdadeiro poder é servir". Aqui, aos católicos da Argentina, ao seu arciprestado (Buenos Aires), aos seus catequistas e ao clero, em cada texto, em cada homilia, o último parágrafo é sempre dedicado à Virgem Maria, não apenas como referência, mas sempre em jeito de oração e prece.
Caro D. António Marcelino. Paulo VI marcou o início do processo (ainda muito longe de se concretizar); João Paulo I, homem bom e justo (muito na linha de Francisco), deixou um pontificado curto e envolto em mistério; João Paulo II foi carismático mas displicente na preocupação com a estrutura da Igreja; Bento XVI, inteligente, mas extremamente dogmático, frio, fechado, distante. Finalmente, depois de João XIII podemos voltar a dizer... "Habemus Papam" como Cristo sempre pretendeu ao erguer a Igreja sob o Apóstolo Pedro.

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