terça-feira, 12 de novembro de 2013

"Epístola" de um crente ao seu Bispo (3)

Porque a vida também se lê…
Caro D. António Francisco
Passado este 32º Domingo do Tempo Comum, o Evangelho lembrou-nos, na sua proposta litúrgica (Lc 20,27-38), o “mistério da nossa fé”: a morte e a Ressurreição. Deus olha-nos sempre pelo lado da vida, da eternidade (uma ‘nova vida’), da salvação, da Sua companhia e presença, do Seu Reino que não terá fim. E deverá ser nesta capacidade de nos envolvermos neste ‘mistério de fé’ que encontramos Deus e nos encontramos através de Deus. É pela condição de pecadores, de quem necessita e procura a salvação, que encontramos na Ressurreição uma ‘vida nova’, uma perspectiva renovada (em cada perdão) de caminho diário ao encontro dos outros e de Deus.
Nesta perspectiva, independentemente dos caminhos em comunidade e em comunhão, a fé (que só Deus consegue “medir”) é uma caminhada pessoal (mesmo que não isolada) numa relação directa do crente com (o ‘seu’) Deus.
Por isso só posso louvar a iniciativa do Papa Francisco em enviar à Igreja (clero, comunidades e cristãos) o documento preparatório (questionário) como base de trabalho para a próxima Assembleia Extraordinária do Sínodo dos Bispos, em 2014.
Este documento, apesar de ligado às vivências da fé em família (deixarei a análise ao mesmo para outro tempo), coloca à Igreja novos desafios, novas realidades, um repensar de determinados dogmas e fundamentos sacramentais, do ponto de vista pessoal, de cada católico.
Há quem diga e defenda estoicamente que o documento não coloca em causa dogmas ou o sacramento do matrimónio, por exemplo. Mas a verdade é que os novos desafios que se colocam à família (nem todos negativos) têm a faculdade de colocar muitas e inquietantes interrogações aos cânones da Igreja.
Há quem afirme, de forma inabalável, que o “pecado” há-de continuar sempre “pecado”, não estando em causa o “pecador”. Em teoria, sim… Deus enviou-nos o Seu Filho para a salvação dos pecadores, dos que sofrem, dos injustiçados, dos excluídos. Mas também, pelo “mistério da fé” para a remissão dos pecados.
No entanto, não tem sido coerente e consistente o papel da Igreja (clero, comunidades e cristãos) em relação ao pecador. Só Deus pode “perdoar” e “julgar” (embora Deus, que é amor, tudo e a todos – os que assim o quiserem – perdoará e acolherá), não fazendo, por isso, qualquer sentido que a Igreja, as comunidades, os fiéis, sejam eles julgadores e juízes dos actos e dos pecadores. Infelizmente, é o que existe, de mais, na Igreja. A exclusão, o rótulo, a indiferença para os pecadores, os diferentes, as minorias, os “gentios”.
Por Cristo, com Cristo e em Cristo.

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